Há muito tempo já escrevi sobre o insustentável peso de ser. O insustentável
peso de ser professor numa ordem que desconfia, menoriza, oprime. O peso da
sobrerregulamentação, das rotinas asfixiantes e da inércia que nos esvazia. O
peso de um mandato social claramente excessivo, claramente impossível, de uma
arrogância que tudo prescreve, quase tudo ignora. O peso de uma pobreza de
pensamento que se diz ao serviço da democratização, da competitividade, da
meritocracia, da diferenciada igualdade de oportunidades.
Hoje, regresso ao tema para o dizer na sua
hiperbolização. Porque as escolas são agora ambientes muito mais agressivos,
muito mais exigentes; porque as identidades profissionais estão agora em ferida
e em risco de se despedaçarem; porque os professores estão cada vez mais
entregues a si mesmos numa solidão ontológica e antológica; porque a autoridade
tem maiores dificuldades de se afirmar e de exercer num quadro geral de
desvinculação organizacional e profissional (não demorará muito tempo a
manifestar-se a disforia de viver e de trabalhar nos megagrupamentos,
aparentemente uma solução que integra, articula e reforça a coesão).
Hoje, é muito mais difícil ser professor. É
difícil acreditar num discurso cheio de promessas e de boas intenções. É
difícil agir em contextos tão desconexos, tão centrífugos, tão enredados em
múltiplas contradições. É muito mais difícil convencer os novos públicos
escolares de que estudar vale a pena, que estudar compensa, que estudar é uma
condição de liberdade e de sobrevivência.
Hoje, os professores vivem reféns de um
ideal de escola que já não existe. Reféns de uma dádiva que sempre quiseram
inscrever nos seus modos solidários de agir. Reféns de uma (des)ordem
profissional que persiste em não ensaiar as condições de sobrevivência.
É por isso que, às vezes, surge a tentação
de desistir. A tentação de nos abandonarmos. Mas não nos resta outra
alternativa que não seja persistir na reinvenção de dias mais claros. Persistir
na procura das soluções concretas, na procura das soluções possíveis. Exigir
mais de nós mesmos, mas numa lógica de construção de Comunidades Profissionais
de Aprendizagem que possam tecer os laços que permitam novos exercícios de
respiração. E exigir mais das famílias e dos poderes públicos. Em nome das
crianças e dos adolescentes que só veem negrume à sua frente. Em nome de uma
profissão que se tem de redescobrir.
José Matias Alves